(Análise) Stone Age - é pau, é pedra, é o início do caminho!

Stone Age – É pau, é pedra, é o início do caminho!

Título : Stone Age (2008)
Designer : Bernd Brunnhofer
Arte : Michael Menzel
Editora nacional : Devir
Nº de jogadores :2 a 4

Alguns jogos se tornam verdadeiros ícones dentro do hobby de jogos de tabuleiro, não apenas por seu tempo de existência, mas também pela excelência da experiência que entrega aos jogadores. Dentro dos jogos do estilo europeu e de peso leve, Stone Age certamente tem seu lugar garantido entre os grandes títulos de nosso hobby.
Através de alocação de trabalhadores e rolagens de dados, os jogadores irão tomar o papel de famílias que viveram na Idade da Pedra Polida e deverão coletar recursos como comida e pedra para sobreviver e vencer seus adversários.

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Critérios

Ø Arte

Stone Age apresenta uma arte incrível, feita por Michael Menzel, que além de ilustrador de uma quase incontável quantidade de jogos, também é designer, tendo como sua autoria mais famosa a saga de jogos As Lendas de Andor.

O jogo apresenta uma paleta de cores mais voltada para tons terrosos, porém sem nenhum exagero, onde as ilustrações retratam paisagens que buscam realismo com um ar levemente aquarelado. O tabuleiro central em si é uma obra de arte, um quadro (bem característica do ilustrador, aliás), que retrata a pequena aldeia e suas imediações, com os mais diversos tipos de terrenos. O restante dos elementos artísticos segue a mesma linha, desde o tabuleiro individual até as cartas.

Em Stone Age não temos nenhum tipo de texto (tematicamente nem poderia, né!?), tendo apenas números como referência e iconografias. Todas iconografias são de fácil entendimento, uma vez que os recursos do jogo possuem o mesmo formato das ilustrações em si, com exceção do ícone “qualquer recurso”.

(Tabuleiro central durante partida, com todos componentes)

Ø Qualidade dos Componentes

Stone Age não possui apenas uma arte incrível, mas também componentes de excelente qualidade e muito esmero na produção.

O jogo vem com diversos elementos que podemos elogiar: Meeples (peões dos jogadores) em um formato único (como se fossem cabeludos e despenteado); cartas de excelente qualidade (que por não ficar nas mãos dos jogadores não exigem sleeves (os plastiquinhos de proteção)); marcadores de papelão para comida, todos de boa gramatura e com tamanhos e arte diferenciada para a quantidade que cada um representa; Fichas de Construção, em papelão cartonado de excelente gramatura; dados de madeira de boa qualidade, porém leves; recursos em madeira, nas cores e formato do que representam (madeira, tijolo, pedra e ouro); tabuleiros de boa gramatura e acabamento; e, em algumas edições, um copo feito de couro (algumas versões não possuem este copo por determinação do Inmetro) que serve apenas para rolar os dados, não tendo nenhuma função real (digo isso para que você não fique achando se tratar de um problema caso você não tenha o copo, caso adquira o jogo).

Contudo, temos também um elemento ruim: A caixa. Ela possui um formato retangular com um tamanho um pouco mais alto do que o convencional, devido ao copo de couro, mas o problema não é o tamanho, mas sim o fato de ser feita com um papelão relativamente fino, o que a faz ser meio molenga, principalmente a tampa.

O manual do jogo, contudo, é outra coisa a se elogiar. Ele é bem diagramado, cheio de ilustrações e exemplos. Como Stone Age é um jogo relativamente simples, acaba sendo uma boa indicação para jogadores iniciantes, logo um manual bem feito é primordial para este público, uma vez que ele não tem ainda muita familiaridade com o hobby.

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(Tabuleiro com partida em andamento)

Ø Curva de Aprendizagem

As regras são bem simples e diretas, o que faz Stone Age ter uma curva de aprendizagem muito baixa. As regras são tão fáceis que mesmo quem nunca jogou nada antes consegue pegar após pouquíssimas rodadas.

Em relação a mecânica de alocação, são basicamente 3 tipos diferentes de locais de alocação: Recursos, onde o jogador ao remover o peão rola um número de dados igual o número de peões removidos (de sua cor) e a soma dos dados são convertidos na quantidade de recursos correspondente ao valor do recurso em questão; Cartas ou Fichas de Construção, onde os jogadores pagam recursos e ganham pontos ou cartas (e seus bônus); Locais de vila, onde o jogador ao remover o peão ganha o item referente ao espaço, sendo mais 1 na Trilha de Agricultura, ganham mais 1 no valor da Ficha de Ferramenta ou ganha 1 peão adicional para sua família. Após as alocações e resoluções, ainda existe uma fase de alimentação, onde os jogadores descartam comida de acordo com a quantidade de meeples que possuem (subtraindo o valor que esteja na Trilha de Agricultura). Ok, a frase ficou longa, mas isso é o jogo todo na essência, portanto acreditem: É bem fácil e super intuitivo. Na segunda rodada, provavelmente não haverá mais nenhuma dúvida na mesa!

Por outro lado, saber ler as oportunidades e o que os adversários pretendem fazer não é tão fácil, principalmente jogando contra jogadores experientes, onde saber decidir cada momento de alocação e saber quando arriscar é crucial. O jogo, portanto, quando jogado contra jogadores experientes, abre um novo leque de situações a serem observadas, como momentos onde um peão deve ser colocado para bloquear a compra de cartas ou Fichas de Construção ou quando abrir mão de locais importantes, como os da vila, em detrimento a pegar mais recursos. Outro elemento de exige certa atenção são as Cartas de Civilização e suas pontuações de final de jogo, pois elas são muito poderosas, principalmente as cartas de fundo verde que pontuam por uma coleção de componentes (imagens diferentes). Não é raro em primeiras partidas jogadores iniciantes se encantarem com a pontuação imediata das Fichas de Construção e ignorarem as cartas, e quem foca nelas vence com folga (em partidas com jogadores experientes a tendência é um bom equilíbrio entre estas estratégias).

Uma característica de Stone Age é ele ser um jogo onde é preciso fazer continhas, mas todas são bem simples, resumindo-se em soma e divisão, nada que mesmo crianças de 10 anos não consigam fazer, apesar de ler as probabilidades percentuais exigir um pouquinho mais de massa cinzenta (porém, para mim, nunca o ato de pensar é ponto negativo em jogos).

Ø Presença de Tema

O manual do jogo traz um panorama com dois parágrafos, porém ele não é muito condizente com a realidade histórica, uma vez que falta precisão nos detalhes.

Na verdade, apesar do título do jogo ser apenas “Idade da Pedra” (tradução de “Stone Age”), o período conhecido como “Idade da Pedra” é muito abrangente, indo do final do Paleolítico (por volta de 13.000 aec (aec = Antes da Era Comum)) chamado de “Idade da Pedra Lascada”, passando pelo Mesolítico (por volta de 8.000 aec) e culminando na chamada “Idade da Pedra Polida”, conhecida formalmente como Período Neolítico (que foi até por volta do ano 3.000 aec). É em algum ponto próximo do final deste período Neolítico que o jogo se passa, devido aos elementos que vemos nele, como o uso de ferramentas mais complexas, criadas a partir de diferentes tipos de materiais (como as machadinhas), o início do cultivo e agricultura, uso de pequenos barcos, a criação de peças de cerâmica e outras tecnologias e o uso de vestimentas elaboradas a partir de tecidos rudimentares.

Do ponto de vista temático, agora que sabemos que não somos homens das cavernas (como já ouvi por aí jogadores declarando em suas jogatinas), percebemos que as cartas fazem sentido, assim como a ilustração e a simplicidade mecânica. O comércio praticamente não existia ainda, logo a simplicidade do jogo retrata bem a forma de vida da época: Era sair para caçar ou extrair recursos pela manhã e se alimentar a noite. Nada mais. Simples assim.

Tematicamente outro elemento em Stone Age que faz sentido (apesar de jogadores que odeiam elementos aleatórios em jogos torcerem o nariz) são os dados! Neste período da história humana nada era certo, logo a aleatoriedade de rolar dados para definir a eficácia de uma caçada ou exploração por recursos faz todo sentido, ainda mais com a hipótese de utilizarmos ferramentas (machadinhas, no caso) para aumentar nossa eficiência. Imaginem o quão difícil era quebrar e carregar pedras montanha abaixo, apenas usando suas mãos praticamente!

Concluindo o tópico, portanto, podemos dizer que o apelo temático de Stone Age, apesar de não se esforçar muito no manual, é bem forte, ainda mais sendo um jogo simples e acessível para iniciantes no hobby, uma vez que mecanicamente faz sentido cada elemento apresentado no jogo.

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(Exemplo das carta do jogo)

Ø Rejogabilidade

Em questão de elementos que alteram a forma de se jogar, a forma de pontuar ou criam assimetria entre os jogadores, Stone Age não apresenta nada. Porém, por se tratar de um jogo onde arriscamos a sorte constantemente através da rolagem de dados, somos sempre instigados pelo jogo a fazer jogadas mais arriscadas quando necessário ou jogarmos de forma mais segura quando possível, tudo dependendo da leitura do que nossos adversários estão fazendo. Dessa forma o jogo cria um desafio e uma tensão ao rolar os dados que motiva os jogadores a jogar mais vezes, por não ficar um “aloca peão, desaloca peão” monótono. Agregado a isso, temos ainda a abertura de cartas e Fichas de Construção que são feitas de forma aleatória, a partir de montes de compra (sendo que as cartas muitas vezes nem chegam a aparecer todas em uma única partida).

Ø Interação

A interação ocorre apenas na obstrução de espaços na alocação de trabalhadores, sem nenhum tipo de “Toma Essa” (mecânica que consiste em jogar coisas que atrapalham os adversários). Este nível de interação se encaixa com a proposta de Stone Age de ser um jogo estratégico e leve, boa opção para jogadores iniciantes, além de não sobrecarregar o elemento sorte presente ou abafar o efeito de tensão gerado pela rolagem de dados. Efeito este que, apesar de não criar nenhuma interação propriamente dita entre os jogadores, faz com que todos na mesa voltem sua atenção à rolagem, seja torcendo contra ou a favor o jogador da vez!

Ø Fator Sorte

Stone Age tem rolagem de dados. Rolagem essa que se resolve após a decisão da ação tomada, algo que pode incomodar os eurogamers mais puristas, contudo além disso trazer uma dose de emoção ao jogo, confere a Stone Age um elemento de leitura de oportunidades e riscos, com um quê de jogo de apostas, além de casar bem tematicamente (como já citado no item Tema). Tendo tudo isso em vista, podemos dizer que o Fator Sorte é alto e pode ser inclusive responsável por fazer o jogador não conseguir determinada pontuação (ao não conseguir comprar uma Ficha de Construção) caso arrisque e dê azar nessa rolagem, mas isso vai depender muito do quanto o jogador arrisca e o quanto joga seguro, o quanto ele tenta dispersar seus meeples pelos locais ou concentrá-los em uma única ação para (tentar) garantir mais recursos para uso futuro. Logo, apesar da sorte envolvida, ela vai se adaptar mais a forma que os jogadores jogam do que ser algo intrínseco das mecânicas do jogo (eu mesmo já vi jogador que arriscou pouco vencer o jogo em partida com gente maluca que tentava o tudo ou nada no dado!).

Vale lembrar ainda que o jogo possui o recurso “Ficha de Ferramenta”, simbolizada por machadinhas, que servem para adicionar valores ao dado, mitigando a sorte, e isso é um elemento bem integrado ao jogo, mecânica e tematicamente.


Ø Fator Estratégia

Apesar da sorte dos dados, Stone Age apresenta um fator tático (a curto prazo) relativamente elevado, assim como algumas escolhas estratégicas (a longo prazo) interessantes. Uma vez que o impacto da sorte é esperado, os jogadores devem sempre considerar diversos cenários em sua mente, tanto aqueles que tiveram sorte como os que deram azar, para conseguir moldar suas escolhas e o quanto arriscar. Além deste elemento aleatório da rolagem de dados, saber o momento de alocar seus meeples é importante, para não sofrer bloqueios ou mesmo bloquear os adversários quando preciso. No final das contas, Stone Age é um jogo de otimização de ações onde o jogador com o melhor timing (julgamento de quando é o melhor momento para tomar ações) vence.

Um assunto que não tem como passar batido em uma análise de Stone Age é a existência de estratégias padrões, consideradas por alguns imbatíveis, como a chamada “Estratégia da Fome” (não entrarei em como ela funciona). O que posso dizer sobre é que tal estratégia é combatível, mas apenas em mesas mais experientes. Caso um jogador usar tal estratégia e a galera na mesa perceber apenas tardiamente, dificilmente ele irá perder. Dessa forma, jogar Stone Age com uma mesa mista entre jogadores experientes e iniciantes pode dar uma certa vantagem para quem conhece a estratégia. Uma forma de evitar a existência desta estratégia é o uso de (polêmicas) regras da casa. Pela internet existem diversas regras das casas para Stone Age, para os mais variados fins, como diminuir o Fator Sorte, aumentar a dificuldade na aquisição de cartas e mesmo evitar a Estratégia da Fome (não pode dar sopa de madeira #entendedoresentenderão). Não entrarei nessas regras, pois seu uso trata-se de um gosto mais pessoal (é possível encontrar sugestões pelos fóruns e arquivos na Ludopedia e BGG).

Perguntas Frequentes:

1. Consigo jogar com crianças? Sim. Stone Age tem uma mecânica bem simples, onde a malícia de saber quais melhores ações é necessária, porém nada impede que seja jogado de uma forma menos marcada com crianças, inclusive acredito ser um belo exercício de gestão de recursos e mesmo operações matemáticas simples para os pequenos.

2. Funciona bem em menos jogadores? Sim, funciona. O jogo possui regras de alocação específicas para 2 e 3 jogadores, logo ele se adequa a quantidade de pessoas na mesa sem perder nada em sua essência.

3. Não tenho o copo de couro. E agora? E agora, que nada muda. O copo simplesmente é um mimo temático, mas não tem nenhuma importância no jogo. Eu mesmo prefiro rolar os dados na mão, de forma tradicional, do que usar o copo.

4. Existem expansões? Sim, contudo nenhuma veio para o Brasil, logo nem tive a felicidade de conhece-la ainda.

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Opinião Pessoal

“Stone Age é daqueles jogos que entregam uma experiência divertida e rápida (para um jogo de caixa grande), sem perder a essência mecânica de eurogames, sendo uma excelente opção para apresentar as mecânicas de gestão de recursos e alocação de trabalhadores para aquelas pessoas que não sabem o que é isso. Porém, ainda sem perder uma profundidade competitiva e apertada de se jogar em uma mesa com jogadores experientes. O jogo, do jeito que é, acho muito bem amarrado, contudo sou adepto de regras da casa quando elas proporcionam mais diversão e adequam-se aos gostos da mesa, logo acho que as regras da casa de ‘Recursos diferentes para aquisição de cartas’ e ‘Só recurso de Comida pode servir de alimento’ são essenciais para deixar o jogo mais difícil quando jogando em mesas experientes.” (Raphael Gurian, o minerador de ouro)

“Stone Age é um jogo que exige uma boa noção de gestão de recursos e alocação de trabalhadores, fazendo com que o jogador pense muito bem suas estratégias, que podem ser frustradas facilmente pelos demais jogadores. Se não forem bem planejadas suas ações futuras, os recursos se tornarão escassos e será difícil garantir uma boa pontuação a cada rodada. Apesar disto, este jogo é uma ótima opção para jogadores iniciantes deste gênero, pois apresenta consideravelmente bastante possibilidades de estratégia com baixo nível de dificuldade. A arte e a qualidade dos componentes são muito boas e agrega bastante ao jogo, tornando-o mais atrativo, mesmo após doze anos desde seu lançamento. É uma ótima opção para se jogar tanto em dois quanto em mais jogadores, funcionando muito bem e não se tornando enjoativo.” (Heloisa C. Fernandes, a artesã com argila)




Um texto de
Raphael Gurian



A ideia deste formato de análise não é explicar um jogo, para isso existem muitos outros textos, vídeos e etc. A finalidade do texto é fazer uma análise crítica acerca de critérios que acho importante e que muitas vezes acabam não sendo explorados em reviews de uma forma mais detalhada. Os jogos analisados não seguem qualquer critério comercial, incentivo ou pagamento, sendo escolhidos com base em fontes de vozes da minha cabeça, aliado ao fato de ter já jogado o jogo em questão muitas vezes, a ponto de me sentir confortável em opinar sobre o mesmo.

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Esse foi um dos poucos jogos em que tive a vontade de sair da mesa durante a partida… Quando eu coloquei 4 trabalhadores na floresta e tirei 1,1,1 e 2, eu simplesmente desisti do jogo. Entendo que ele é um bom gateway pra galera, mas quero distância… xD

Acontece, cara! hahaha

Mas posso falar por experiência própria: Com a prática, algumas rolagens completamente desastrosas ainda podem acontecer e o jogador ainda assim consegue vencer! :smiley:

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